Descaso entre indústria musical e público fica evidente com sucesso de canções na Internet
Por: Antón Vélez Bichkov
Os antigos diziam que a voz do povo, era a voz de Deus (Vox pópuli, vox dei...). E quem pode negar quando vê a canção Migalhas, do mais recente lançamento da cantora Simone, estourando em um veículo bem mais democrático que a mídia tradicional e pouco ou nada referenciada em meios típicos de promoção musical (rádio/tevê).
Estamos falando no Youtube, onde o carro-chefe do CD Na Veia (Biscoito Fino, 2009) já foi executado entre os 20 e tantos vídeos que a contém, umas 211 mil vezes até a tarde de ontem, dia 10 de novembro de 2009.
Colocada originalmente pela usuária VanessaB1980, há uns dois meses, a música foi rapidamente replicada por um número significativo de membros do site, com maior ou menor preferência, mas todos com uma marca, o número de reproduções cresce exponencialmente.
Exemplo disso é versão de cbianculli que depois de apenas uma semana ‘no ar’ já foi vista 4281 vezes (de acordo com a página de buscas do site, sempre desatualizada se comparada com o número real de execuções). O número de MCC052009 é ainda maior, pois apesar de ter subido a canção apenas há duas semanas já conta 10329 exibições. E como eles outros.
É evidente que a ‘criatividade’ dos internautas influi na hora da escolha (vejam o caso da Vanessa, que não apenas foi a pioneira, mas criou um imaginativo e terno videoclipe em forma de desenho animado, para ilustrar a interpretação de Simone). Ela é, por enquanto a que mais execuções tem, seguida de perto pelas versões on-line da trilha da telenovela “Viver a vida”, que inclui a composição do Erasmo Carlos, como tema da drunkoléxica Renata (Bárbara Paz).
E mesmo sabendo da força desse tipo de promoção, é preciso dizer que a canção começou a ‘acontecer’ mesmo antes de a novela começar a decolar no gosto do público (coisa que de fato não é tanto, pois seus números beiram os 38 pontos, baixo para o horário e o autor, considerado um campeão de audiências).
O mais paradoxal, no entanto é o fato de Migalhas, não entrar nem sequer de perto na lista das cem canções mais executadas no Brasil no momento. Nenhum Toc, nem Top-100, a inclui.
Aqui vemos o evidente descaso entre indústria e público. Uma, pagando sumas milionárias tenta impor e fabricar sucessos custe o que custar; o outro, mesmo enfeitiçado pelas veleidades do mercado, também faz a sua escolha e não deixa mentir.
Esse também é o caso de Sol e mar, de Gal Costa – pescada de um lançamento de há uns anos – que ‘miraculosamente’, também goza de popularidade na Internet, mas não na mídia ‘oficial’.
Verdade seja dita no site Sonora.com.br a música da Simone era a décima mais ouvida e o disco estava em lugar de privilégio entre as obras da MPB, porém, aqui, mais uma vez estamos falando de um mecanismo aparentemente ‘democrático’, em que são as pessoas que decidem o que irão ouvir, por livre e espontânea seleção.
Na Biscoito Fino, que é a nova casa da artista desde o lançamento anterior, Amigo é casa, dividido com Zélia Duncan, são a Abelha Rainha e a Cigarra, as grandes estrelas, pois delas são as dez faixas mais baixadas. Essa é outra opção que não há forma de explorar, salvo que os próprios empresários revelem dados: o comércio eletrônico, que veio diversificar de forma substancial a forma em que as pessoas consumem música.
Sem contar a pirataria, em que a Simone também está fazendo ‘sucesso’ (talvez para sua contrariedade). Para nosso pesar não temos estatística exata de quantas vezes o Na veia foi baixado de forma ilegal, mas o certo é que desde que fora lançado em agosto desse ano, o CD está em quase todos os sites desse tipo.
O moral da história? A indústria impõe gostos, mas a voz do povo, continua a ser, como diziam os antigos (para bem e para mal) a voz de Deus…
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